MINHA MÃE VALE UMA HISTORIA

Em meados dos anos 80 em uma casinha branca no Sertão nordestino, havia uma família peculiar, eu sou a segunda dos 4 filhos de seu Geraldo e dona “Marlene”, uma sertaneja forte, decidida e trabalhadora. Todas as manhãs, mamãe ia para a roça ajudar seu esposo capinar as terras. Seus filhos pequenos ficavam bem embaixo de seus olhos fazendo castelos de areia em meio ao roçado, numa área que mamãe escolhia cuidadosamente para brincarmos, longe dos carrapichos e formigas.
Esta é uma das mais doces lembranças da minha infância...

Antes do meio dia, ela apressava-se em ir para casa, preparar o almoço, pois seus filhos não podiam se atrasar para a escola que ficava cerca de 1 hora de caminhada, e eles iriam a pé. Mamãe jamais deixou que faltassem cadernos e lápis para nós, ela dizia: “o saber ninguém rouba da gente”.
Mamãe sempre nos contava histórias antes de irmos dormir. Certa vez nos ela nos contou que eu pai era mascate e que um dia teve que vender suas terras e mudar para outra região. Quando chegaram lá nas novas terras, enquanto não construía a nova casa eles moraram em baixo de umas pedras grandes por 1 mês. Chamavam “a loca de pedra”, acho que era um tipo de gruta.
Eu ficava imaginando como devia ter sido difícil para eles, então sempre agradecia a Deus por ter uma casa para morar.
Quando chegava seca, o que era normal para nós, fazia (e ainda faz) parte da vida dos sertanejos, as coisas ficavam mais difíceis, sem as chuvas, não podíamos plantar, o milho, feijão e mandioca. Vinham às frentes de emergências do governo federal, minha mãe alistava-se para podermos receber uma cesta básica e alguma remuneração. O trabalho era diário em uma mina, onde todos ficavam quebrando pedras naquele sol. Pedras brilhantes, “mica”. Não usavam para nada as pedras que quebrávamos, era um modo de manter as famílias ocupadas embaixo do sol escaldante. Lembro-me de certa vez sentar a mesa e ver papai agradecendo a Deus pelo alimento, ele sempre fazia isso. Mamãe serviu os pratos e ninguém conseguiu comer aquele feijão vindo na cesta básica, após uma noite inteira de molho, foi cozido desde 5:00 horas da manhã, ao meio dia, ele continuava incrivelmente crocante, amargava como fel...
Houve anos de seca que não tivemos as frentes de emergência, então minha mãe ia até a capital, comprava algumas peças de roupa e saía com meu irmão numa velha bicicleta vendendo ou trocando por galinha, cabrito, guiné ou mesmo por alimentos, era assim que sobrevivíamos naquele Sertão.
Poucas vezes em minha vida vi minha mãe chorar, eu não entendia, parecia tudo bem com nossa família, mas, eu era criança, não entendia a realidade de ser adulto naquele contexto. Talvez ela chorasse por saber que seus filhos tinham apenas feijão “cozido” em água e sal para o almoço, ou porque não soubesse o que eles comeriam no jantar.
Às vezes mamãe me chamava, íamos juntas buscar mandioca para o café da manhã seguinte. Descíamos por um caminho estreito, a caatinga seca arranhava nossa pele queimada do sol, minha mãe se colocava de joelhos e cavava para ver se encontrava a raiz, da mandioca, era nosso pão. Fazia diversas tentativas antes de achar uma raiz que servisse para um cozido (...). Por vezes voltávamos para casa sem nada, no entanto, mamãe jamais saiu pedindo coisas as pessoas, tão pouco saía contando aos outros nossa situação, ela nos ensinou princípios valorosos. Se chegarem numa uma casa e lhes for oferecido algo, podem comer, mas não peçam nada. Nunca peguem nada escondido! Dizia mamãe.
Quando a seca se prolonga no sertão sobreviver pode ser um desafio ...
Meus pais são casados legalmente a mais de 35 anos, minha mãe tem hoje muitos problemas de saúde, dentre eles, o conhecido como “mal de chagas”, pois em nossa casa no sertão havia um quarto sem reboco e os barbeiros, transmissores dessa doença, eram freqüentemente encontrados, caminhado pelas paredes ou em nossas camas. Eu amo minha família. Minha mãe ela é uma mulher sem igual: sua garra, coragem e determinação, me inspiram até hoje,. Ela me fez ver que nada é impossível quando nos propomos a lutar.
Depois de viver por mais de 10 anos longe do Sertão, voltei para realizar um sono proejtos de inclusão social e cooperar com a causa de Deus no nordeste.

Nascia a Pão é Vida. (http://www.paoevida.org/). Em 2007 tive minha história publicada na Revista Época, sob o título: Procuram - se mais brasileiros como estes. Revista Época Edição 479- de 23 julho de 2007. Fui selecionada entre mais de 500 brasileiros que desenvolvem iniciativas semelhantes. Já estive na TV Globo e diversas mídias do Brasil.

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